Por Dirlei Pereira
O poder legislativo de Cabo Frio há anos passa por um paulatino processo de degradação de sua imagem, sejamos justos. Mas a bem da verdade, as críticas feitas aos vereadores de outrora em nada pareciam com as que são feitas aos atuais edis. O que se condenava no passado era, por exemplo, uma mudança brusca de hábitos sociais. Uns, nem bem começavam a esquentar a cadeira e já deixavam de freqüentar os ambientes de antes. Enquanto alguns mudavam de casa e de bairro, outros mudavam até de mulher.
Mas hoje a história é outra. A repulsa da população não é somente ao comportamento social de Suas Excelências. A indignação é de ordem moral, é de atitudes, ou melhor, da falta delas. E o que falta não são apenas atitudes. Não, não, não, três vezes não! Falta muito mais aos senhores representantes do povo. Falta vontade política, coerência e ética. Falta respeito à população e ao dinheiro público. Falta amor a terra. Falta amor aos que sofrem e aos que morrem nas filas dos hospitais e postos de saúde. Falta respeito aos funcionários municipais que, com seus salários de fome, assistem a uma autêntica farra de gordas portarias, dadas a apaniguados de vereadores e de secretários. Falta visão social, em razão da falência generalizada do comércio da cidade, desempregando a milhares de pessoas, sem que nenhuma voz se levante no legislativo. Falta vergonha. Sim, falta vergonha.
Vergonha na cara, senhores vereadores!
Já não se faz mais vereador como antigamente. Que saudade de Onias Cordeiro, pela simplicidade e de Ana Célia, que a todos fazia rir, embora sempre zelosa. Saudade do combativo, aplicado e polêmico Osmar Sampaio, de Hermes Araujo, um autêntico representante dos mais humildes e de Aroldo Menezes, por sua eloqüência. Saudade de Aroldo Francisco, de Mauro Azevedo e de Wilmar Monteiro, que não levava desaforo pra casa. Saudade, até mesmo, de Geraldino Neves, o Cravinho, que quando acuado da tribuna por Alcineides Souza, disparava: “Vossa esselença tá ofendendo minhaesselença”. Saudade de Walter Bessa, com seus vibrantes discursos, sempre conseqüentes.
Saudade dos vereadores da legislatura 1983/1988 (eram 15 à época), entre os quais me incluo. Em 1986, fecharam a Câmara e, na companhia do então prefeito Alair Corrêa e do saudoso deputado Leônidas Sampaio, fizeram uma verdadeira peregrinação até a capital federal. Ida e volta foram três longos e cansativos dias, de ônibus. As refeições eram os sanduiches servidos por João Garçom, o João da Praia do Siqueira. Em Brasília, acamparam na esplanada dos ministérios e de lá só saíram quando foram recebidos pelo Ministro das Minas e Energia, o cearense César Cals. O resultado daquela memorável reunião foi a inclusão de Cabo Frio na lista das cidades produtoras dos royalties do petróleo (até então figurava como limítrofe), uma conquista histórica da sociedade cabofriense.
Tinha-se respeito com os cidadãos. Cultivava-se um sentimento bom, que suplantava os interesses pessoais, políticos e partidários. Havia uma espécie de romantismo na política local, que se foi, paulatinamente, esvaindo, desde que no lugar do governo municipal entrou uma organização criminosa. Encastelada nos porões sombrios da Praça Tiradentes, essa organização criminosa ramificou seus tentáculos diabólicos por toda sociedade. Como em um câncer algumas células malignas podem se desprender do tumor original e se instalar em outras partes do organismo, assim as metástases desse tumor cancerígeno corrompeu famílias tradicionais, aliciou líderes religiosos, subornou setores antes considerados progressistas e impingiu uma vergonhosa mordaça econômica a praticamente toda a imprensa.
Das metástases desse câncer avassalador o Poder Legislativo não escapou ileso. Pelo contrário: de representantes do povo, os senhores vereadores, com raras e honrosas exceções, viraram despachantes de luxo ou lobistas de seus próprios negócios, de suas negociatas junto à prefeitura municipal, chafurdando na lama o nome da instituição.
Não seria exagero comparar a atual Câmara de Cabo Frio àquele templo que, segundo as Sagradas Escrituras, foi transformado pelos fariseus em mercado livre de coisas pecaminosas. Assim é hoje o Poder Legislativo local, com seus fariseus e seus lobos devoradores travestidos de ovelhas. Sem falar das práticas, ainda mais maléficas que aquelas de dois mil anos atrás.
Há muito tempo o interesse público foi deletado do debate legislativo, substituído pelos luxuosos almoços e lautos jantares. No cardápio, além dos caríssimos vinhos importados, outro líquido precioso, o petróleo, ou melhor, uma fatia dos milhões dos royalties do petróleo.
Se hoje Jesus entrasse na Câmara de Cabo Frio (faz muito tempo que Ele passa ao largo dali), chamaria a muitos de hipócritas, de raças de víboras e de sepulcros caiados, porque são bonitinhos por fora, mas por dentro estão podres e cheiram mal. Jesus, com certeza, pegaria o chicote e meteria no lombo de cada um daqueles que profanam a casa de Deus. Sim, a Casa de Deus, já que todas as reuniões plenárias são abertas em nome de Deus, conforme manda a Lei Orgânica Municipal.
A propósito, um conselho (não meu) mas do apóstolo Paulo, aos religiosos da Casa, quer católicos, quer evangélicos, no que tange aos rumores que correm por toda a cidade, dando conta da existência de um suposto mensalinho e sobre o também suposto favorecimento de vereadores através de empreiteiras a eles ligadas: “Fujam da aparência do mal”, ensinou Paulo. Lembro também o episódio ocorrido nos anos
Dirlei Pereira é ex-vereador.
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